segunda-feira, 23 de março de 2015

As aventuras de um garoto de programa by Phil Andros

As aventuras de um garoto de programaAs aventuras de um garoto de programa by Phil Andros
My rating: 3 of 5 stars

Um conjunto de 12 contos, mais ou menos interligados por um personagem central ("o garoto de programa", um prostituto) e alguns temas recorrentes, como o sexo gay e interracial. Os textos são interessantes, transportando-nos para um ambiente americano dos anos 60 do século vinte, tanto no cenários do "wilderness" americano, como nas grandes cidades de Chicago e NY. Surpreende pelo que revela acerca da cultura do autor, o que não é habitual neste tipo de livros eróticos mais explícitos, e pela completa falta de menosprezo ou de arrependimento do prostituto pela sua vida e comportamento, que surge como perfeitamente humano e natural.
Esta edição foi feita no Brasil, e é a única em português, mas, infelizmente, a tradução é horrível, com erros evidentes. Com uma boa tradução, não hesitaria em classificar este Stud de Phil Andros com quatro estrelas.

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terça-feira, 17 de março de 2015

Na Rua das Lojas Escuras by Patrick Modiano

Na Rua das Lojas EscurasNa Rua das Lojas Escuras by Patrick Modiano
My rating: 4 of 5 stars

Lembrei-me da ópera "A Mulher Sem Sombra" de R. Strauss quando comecei a ler este livro de Modiano. Aqui, o protagonista é um "homem sem sombra", um homem que perdeu a memória e que não sabe nada sobre si próprio, a começar pelo seu nome. Decide lançar-se numa perseguição detetivesca sobre o seu passado, mas com um pudor e uma timidez notáveis, e acaba por descobrir que a sua busca é inútil, como o choro de uma criança: "Chora sem motivo, ou porque queria continuar a brincar. Afasta-se. Já dobrou a esquina da rua - e não se dissiparão, ao anoitecer, as nossas vidas, tão depressa como aquele gesto de criança?"

O livro vale sobretudo pela escrita, calma e distanciada, como se envolvesse o enredo numa névoa, a névoa da memória, e pelo desfilar de uma série de personagens, excecionalmente bem delineados, por vezes apenas com alguns traços, que vão surgindo ao longo do périplo do narrador (estou a lembrar-me do fotógrafo efeminado e paranóico, Mansoure, que morava num apartamento repleto de "cetins, marfins e dourados um pouco enjoativos" e afastava constantemente as cortinas, desconfiando de alguém escondido).


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quarta-feira, 11 de março de 2015

O Marinheiro que Perdeu as Graças do Mar by Yukio Mishima

O Marinheiro que Perdeu as Graças do MarO Marinheiro que Perdeu as Graças do Mar by Yukio Mishima
My rating: 4 of 5 stars

Verão: Noboru descobre um pequeno orifício na parede do quarto da sua mãe e, por ele, deslumbra-se com a nudez de um marinheiro, Ryuji que a sua mãe, Fusako, viúva há cinco anos, levara para casa nessa noite. Inverno: Ryuji apaixona-se por Fusako e, logo que regressa a terra, abandona a vida de marinheiro, atraiçoando o mar, que não lhe perdoará.

Esta novela é sobre o fascínio exercido pelo mar, mas do mar como aventura e, sobretudo, como horizonte para lá do qual estará o destino de cada homem, a sua glória, o que o distinguirá da massa anónima e medíocre. Como tal, é também um livro sobre a vida e sobre a morte, sobre a descoberta, o crescimento, a atração e o sexo, o desapontamento, a dúvida e as escolhas que somos obrigados a fazer. Noboru e Ryuji partilham o fascínio pelo mar e pelos navios, mas, ironicamente, é precisamente quando Ryuji volta a sonhar com o mar, a sentir-lhe o cheiro e o chamamento irresistível, que se desencadeia a tragédia às mãos de Noboru.

"Os fantasmas do mar, dos navios e das viagens oceânicas existiam apenas nessa gota verde brilhante. Mas, por cada dia que passava, mais os odores abomináveis da vida em terra se colavam ao marinheiro: o cheiro da família, o cheiro dos vizinhos, o cheiro da paz, do peixe frito, das piadas e das mobílias sempre imóveis, o cheiro dos livros de contas da casa e dos passeios de fim-de-semana... todos os cheiros pútridos que os homens de terra deitam, o fedor da morte"

A escrita é genial, com algo de misterioso, mas ao mesmo tempo poético, outras vezes intrigante, mas sempre muito sensorial. Mishima é, de facto, um dos grandes escritores do século XX.

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terça-feira, 3 de março de 2015

Stoner by John Williams

StonerStoner by John Williams
My rating: 4 of 5 stars

A vida simples de William Stoner: a sua infância e adolescência numa quinta isolada de um Estado ignorado dos EUA na primeira metade do século XX; a partida para a Universidade onde fará carreira como professor universitário, o casamento e a filha, os alunos, o grande amigo e o grande inimigo, a amante, a reforma e a morte. Parece linear, mas nenhuma vida é linear, e William Stoner tem uma forma peculiar de encarar a vida: sem ansiedade em relação ao futuro e sem angústias em relação ao passado. Vive para o presente, para o trabalho, para o dever, para o que acha justo e para o que entusiasma. Mas Stoner também é peculiar a encarar a morte: quase como mais um passo lógico, uma fatalidade contra a qual não vale a pena lutar, "business as usual", sem dramas nem emoções.

"Chegara aquela idade em que lhe ocorria, com crescente intensidade, uma pergunta de uma simplicidade tão avassaladora que não tinha como a enfrentar. Dava por si a perguntar-se se a vida valeria a pena,se alguma vez valera a pena. Era uma pergunta, desconfiava ele, que assolava todos os homens a uma dada altura; perguntou-se se os assolaria com uma força tão impessoal como o assolava a ele. A pergunta acarretava uma tristeza, mas era uma tristeza geral que (pensava ele) pouco tinha que ver consigo ou com o seu destino em particular."

A escrita é simples (como Stoner?), fluente e enxuta, mas ao mesmo tempo envolvente, credível e perspicaz. Sentimos-nos na pele de William Stoner, sofremos as suas dores, partilhamos as suas alegrias, e por isso compreendemos melhor o seu olhar pessimista (ou realista?) e pungente que nos obriga a recordar quão breve a vida é quão inevitável o nosso destino.

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