sábado, 27 de dezembro de 2014

Fados by Miguel Botelho

FadosFados by Miguel Botelho
My rating: 4 of 5 stars

Um conjunto de letras para fados, bem ritmados e "gingados" à moda de Lisboa. Os temas são fadistas, pois claro, a paixão ardente, o amor não correspondido, o coração destroçado, a saudade, mas não só... alguns são reflexões sobre a vida, a normalidade, a verdade e a mentira, a ternura de um abraço, enfim, um verdadeiro "baú" de surpresas! E surpresa é, também, a versatilidade de Miguel Botelho como autor, depois do seu livro de contos Elvis sobre a Baía de Guanabara e Outras Histórias, surge agora, inesperadamente, um livro de poesia. Que mais sairá do seu baú secreto de originais?

View all my reviews

domingo, 21 de dezembro de 2014

Cadernos da Casa Morta by Fyodor Dostoyevsky

Cadernos da Casa MortaCadernos da Casa Morta by Fyodor Dostoyevsky
My rating: 4 of 5 stars

Numa cidade perdida na Sibéria, o autor trava conhecimento com Aleksandr Petróvitch, o percetor das filhas do seu anfitrião. É um homem gasto, atarracado e enigmático, que se furta ansiosamente a todas as perguntas do autor. Mas este descobre, perguntando a um e outro, que Petróvitch vive ali sossegadamente depois de ter cumprido dez anos de trabalhos forçados pelo assassínio da mulher. Anos mais tarde, quando regressa à mesma cidade, o autor descobre que Petróvitch morreu, e que, entre as suas coisas, estão uns cadernos manuscritos com as suas memórias dos tempos de prisão. Depois de os ler, o autor decide publicar alguns capítulos, deixando à consideração dos leitores a avaliação do seu mérito.

Em Cadernos da Casa Morta, Dostoiévski conta-nos pela boca do seu personagem principal, o fidalgo Aleksandr Petróvitch, a sua experiência como prisioneiro político, durante quatro anos, num campo de correção siberiano. E o que tem para nos contar não é agradável: o sofrimento e os castigos, o clima duro da Sibéria, a corrupção entre os guardas, a sujidade e os piolhos. "De qualquer maneira, existem desconfortos perante os quais tudo isso se torna insignificante, tão depressa nos habituamos à imundície e a uma alimentação fraca e porca. O mais mimado fidalgote, o mais sensível senhorito, depois de um dia de trabalho em que sua em bica, comerá o pão negro e uma sopa em que nadam baratas." O que "dói" mesmo é a desumanização a que são sujeitos os presos que os leva a tornarem-se gente dura e quase insensível.

Aníbal Fernandes refere este livro como sendo um dos primeiros na literatura russa onde é mencionada a homossexualidade. Mas, tal como a maior parte das suas reflexões e críticas ao sistema prisional e social russo desta obra, Dostoiévski aborda o tema da homossexualidade muito brevemente e numa linguagem cheia de subentendidos. O personagem é Sirótkin, "uma criatura enigmática em muitos sentidos", muito belo, muito sossegado e meigo, gozado por todos os outros reclusos, e de quem Gáizin, um prisioneiro violento, era "muitas vezes, o amigo especial."
Embora seja apresentada por Dostoiévski como uma obra de ficção, a sua estrutura, uma sequência de capítulos temáticos, sem enredo a entreligá-los, reflete a sua publicação como uma série de artigos em jornal e o facto de se tratarem de memórias algo distantes, embora marcantes. Esta é a primeira tradução direta do russo (que até alterou o título tradicional em português, que era Recordações da Casa dos Mortos ) e, talvez por isso, tem um tom rude e pouco "polido".

View all my reviews

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Lisboa no Ano 2000 by Melo de Matos

Lisboa no Ano 2000Lisboa no Ano 2000 by Melo de Matos
My rating: 3 of 5 stars

A descrição da Lisboa do ano 2000 tal como imaginada em 1906. O autor afirma, e talvez seja a sua previsão mais acertada, que "quando muito, bastarão trinta anos para que se realize tudo quanto sonharmos escrevendo.". Com efeito, até as previsões mais arrojadas (armazéns automatizados, bolsas para transações financeiras e de mercadorias de cobertura alargada, comboio a vapor chegando a lisboa por tunel vindo do sul,...) estão quase todas ultrapassadas, e nem sinal dos avanços tecnológicos sem os quais quase não conseguíriamos sobreviver hoje, como o telemóvel, computadores, internet, aviões a jato, satélites, etc.!

No ano 2000, na visão do autor, as margens do Tejo estariam pejadas de cais e armazéns e linhas de caminho de ferro e uma espécie de metropolitano suspenso, as sedes das grandes empresas agrícolas, industriais e financeiras são enormes edifícios, ricamente decorados com alegorias a divindades gregas e romanas.

Mas o livro não deixa de ser interessante, mas mais por revelar a mentalidade reinante à época do que por conseguir antecipar o futuro. O autor faz de Lisboa a capital de um Portugal que se transformou numa grande potência mundial, o centro (a par de Londres) do comércio marítimo mundial, uma cidade onde os engenheiros e cientistas inventam máquinas, processos e produtos inovadores que permitem façanhas impressionantes, sem par no mundo inteiro. É pois uma cosmovisão profundamente nacionalista, industrial, científica, apolítica e arreligiosa, que desvaloriza o património (os Jerónimos e a Torre de Belém são "poupados", mas ficam rodeados de fábricas, armazéns e linhas férreas) face ao "progresso", e, sobretudo, pouco humana. Não admira: em 1906, o mundo encontrava-se à beira da I Grande Guerra, Portugal vivia os últimos anos da monarquia e o prestígio da Igreja atingira, talvez, o seu nível mais baixo face a uma ciência que prometia revoluções...

View all my reviews

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Dois Mundos, A Paz by Pedro Xavier

Dois Mundos, A PazDois Mundos, A Paz by Pedro Xavier
My rating: 4 of 5 stars

Todas as pontas soltas das aventuras que temos seguido ao longo dos últimos quatro volumes da série Dois Mundos se resolvem elegantemente em Dois Mundos, A Paz, o epílogo deste primeiro romance de Pedro Xavier. O protagonista, Pedro, compreende finalmente de que mundo veio e ao que veio, Davis suspira de alívio ao ver o seu amado são e salvo, e os dois constituem a família que sempre ambicionaram e realizam, surpreendentemente, o sonho de terem uma prole numerosa.
Neste livro, o ritmo do enredo continua vertiginoso e a criatividade do autor parece inesgotável. Este talvez seja o volume mais conseguido da série, o que não é de estranhar, pois reflete o natural amadurecimento da escrita do autor.

View all my reviews

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Dois Hotéis em Lisboa by David Leavitt

Dois Hotéis em LisboaDois Hotéis em Lisboa by David Leavitt
My rating: 4 of 5 stars

Dois casais e a cadelinha Daisy encontram-se na pastelaria Suíça, no Rossio, em Lisboa. Descobrem que estão no Hotel Francfort, mas cada qual no seu Francfort, pois, fruto de desavença familiar, existem dois hotéis com o mesmo nome na cidade. Ambos os casais vêm de França, fugindo das tropas nazis que, em 1940, chegaram a Paris e ameaçam invadir a Península Ibérica. Ambos esperam embarcar dentro de uma semana no paquete Manhattan, enviado pelos americanos para resgatar os seus compatriotas refugiados que se acumulam em Lisboa. É neste ambiente claustrofóbico, de grande incerteza, sem passado nem futuro, neste intervalo em que o tempo se suspende num canto da Europa que ainda vive uma paz podre sob a garra asfixiante de Salazar, que se acende uma paixão intensa, mas fugaz, entre Edward e Peter (o narrador). E é precisamente esta paixão que irá desencadear as tensões que, nessa única semana em Lisboa, levarão a um desenlace trágico que mudará para sempre a vida dos dois casais.

A escrita de David Leavitt é saborosa, e a forma como consegue retratar cada um dos quatro personagens principais, os dois casais, é deslumbrante. Fascinante também (já que o enredo é simples e quase secundário) é a forma como o autor coloca os seus personagens no cenário da cidade de Lisboa, quase como se a cidade fosse um palco, uma sucessão de fotografias de fundo onde a ação decorre naturalmente, ou melhor, perfeitamente.

View all my reviews

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O Segundo Armário: Diário de um Jovem Soropositivo by Gabriel de Souza Abreu

O Segundo Armário: Diário de um Jovem SoropositivoO Segundo Armário: Diário de um Jovem Soropositivo by Gabriel de Souza Abreu
My rating: 4 of 5 stars

Um relato na primeira pessoa, honesto e corajoso, do que é sentir o chão escapar-se debaixo dos pés ao receber a terrível notícia de uma infeção por HIV. Não estando ainda completamente fora do "primeiro armário", o da sua homossexualidade, Gabriel de Souza Abreu é empurrado à força para um "segundo armário", o de ter de esconder a sua seropositividade: da família, para não magoar a mãe, dos amigos e namorados, para poder continuar a amar e a ter sexo, e dos colegas, para evitar ser discriminado no emprego. Mas Gabriel consegue ir superando todas as barreiras, uma a uma, tanto as que lhe colocam como as que ele coloca a si mesmo, e acaba por descobrir uma vocação, a de ajudar e aconselhar os jovens atingidos pelo mesmo problema.

View all my reviews