terça-feira, 20 de janeiro de 2015

O Bom-Crioulo by Adolfo Caminha

O Bom-CriouloO Bom-Crioulo by Adolfo Caminha
My rating: 4 of 5 stars

O Bom Crioulo é considerado um dos expoentes da vertente naturalista do realismo brasileiro, que se caracterizou por opor ao sentimentalismo exagerado do romantismo os impulsos biológicos e sociológicos que condicionam a natureza humana, propondo-se descrever a vida tal como ela é. Aos personagens e cenários idealizados do romantismo, em que belas donzelas morrem de amores pelos seus bravos príncipes em ambientes idílicos, responde o realismo naturalista com as fortes pulsões biológicas humanas, como a fome e o sexo, oferecendo-nos retratos vivos em que não surgem disfarçadas as mazelas da realidade, por vezes miserável, cruel e abjeta.

Em O Bom Crioulo, Adolfo Caminha escolhe para personagem principal Amaro, um imponente e lúbrico marinheiro negro, escravo fugido de uma fazenda, que se apaixona por Aleixo, um jovem e ingénuo grumete branco do seu navio de guerra. Para além de ter sido uma das primeiras obras literárias brasileiras a apresentar um negro como personagem principal, foi a primeira a ousar escolher como tema principal a homossexualidade. Robert Howes refere mesmo que O Bom Crioulo (1895), de Adolfo Caminha, em conjunto com O Barão de Lavos, de Abel Botelho, e O Senhor Ganimedes (1906), de Alfredo Gallis, “são das primeiras obras literárias modernas numa língua europeia a tratar abertamente o tema da homossexualidade masculina. (…) Em contraste com o tratamento encoberto dos romances ingleses da época, os romances portugueses eram bastante mais abertos no retrato que faziam do sexo e da sexualidade”.

Mas o livro de Adolfo Caminha destaca-se ainda por outro motivo, é o único dos três citados que é quase acrítico em relação à homossexualidade. Enquanto o barão de Abel Botelho é um pederasta que desencaminha rapazes jovens e inocentes para seu prazer sensual, e Alfredo Gallis apresenta o seu livro como um alerta às raparigas casadoiras, para que se previnam de ligações a homens que as desonrarão com os seus vícios, e aos pais, para que não aceitem para os seus filhos uma educação “errada e maricas”, contrapõe Caminha uma narrativa surpreendentemente livre de moralismos exagerados e de homofobia.

O Bom Crioulo foi recebido com escândalo pela crítica literária e com o silêncio do público, devido à ousadia de abordagem de temas tabu, como o sexo inter-racial e a homossexualidade em ambiente militar, com uma frontalidade e erotismo pouco usuais para a época. O romance foi esquecido na primeira metade do século XX mas voltaria a ser publicado na segunda metade do mesmo século, tendo posteriormente sido traduzido para o inglês, espanhol, alemão, francês e italiano. Atualmente, faz parte do programa de leituras do exame vestibular de muitas universidades brasileiras.


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